
Alice Venturi
(1979) é formada em História da Arte pela Universidade Estadual do Rio de
Janeiro (UERJ). Diz ter em comum com o Releituras " esta paixão louca por
escritores (novos ou não) e seus textos...". Texto extraído do
livro "As maravilhas do país de Alice." |
.Alguma mágoa.
Alice Venturi
Vinha trazendo no coração uma mágoa antiga que só fazia doer. Não sabia o que fazer
com ela. E como apertava... E como doía... Ficava ela ali no canto esquerdo, bem quieta.
Dava os ares de sua graça nas horas mais impensáveis. E como manchava... E como mexia...
Pulava no peito como bola desgovernada que desce a ladeira sem olhar para os lados. Queria
esquecê-la. Queria traí-la. Trancá-la lá fora sem pena da chuva. Deixando-a molhar
como pano de porta, que sem borda aos poucos se encharca. Queria poder juntá-la com as
mãos e com desespero de marujo perdido, arrancá-la para fora do barco. Deixá-la à
deriva em companhia das ondas. Ela que se salvasse. Que se afogasse lentamente na
imensidão fria dos mares. De longe eu acenaria em meu iate invencível, lamentando por
não ter feito isso há mais tempo. Feliz por ter extirpado todo o tumor. Chegaria em casa
tranqüila, talvez cansada da viagem. Tomaria uma Novalgina e iria cheia de graça pra
cama. Sonharia com cores impossíveis e palavras ainda perdidas. Acordaria plena.
Descansada. Completamente feliz. Escreveria meus versos roubados do invisível e ouviria
os sons capturados do mundo. Prosseguiria vivendo a procura do irreal e do permitido. E
seria feliz se não fosse a falta que se alojaria no peito clamando pela mágoa uma vez
perdida, a reclamar junto com a lua sua ausência.
E-Mail: aliceventuri@hotmail.com
Site:
http://www.aliceventuri.com.br
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