Leon Eliachar
Definição de Humorismo
"Humorismo ?a arte de
fazer cócegas no
raciocínio dos outros. H?duas espécies
de humorismo: o trágico e o cômico.
O trágico ?o que não consegue fazer rir;
o cômico ?o que ?nbsp; verdadeiramente
trágico para se fazer. "

Leon Eliachar nasceu na cidade do Cairo, no Egito, no dia 12 de outubro de
1922. Veio muito pequeno para o Brasil e se tornou um dos melhores jornalistas de
humor da imprensa falada e escrita, após ter atingido a idade da razão ou do
disparate, como costumava dizer. Era tão brasileiro como qualquer brasileiro,
embora conste que nunca tenha se naturalizado.
Jornalista desde os 19 anos de idade,
trabalhou em diversos jornais e revistas, fixando-se, por último, na "Ultima
Hora", onde, seguindo o exemplo de Aporelly (o Barão de Itarar? nos tempos de
"A Manh?quot; com "A Manha", mantinha uma página, às vezes reduzida a
meia, com o título de "Penúltima Hora". Justificava o nome da página com
a legenda "Um jornal feito na véspera".
Colaborador (arrependido, segundo o
autor) dos argumentos de dois filmes carnavalescos, foi autor de programas de rádio e
secretário da revista "Manchete".
Em 1956 foi laureado com o primeiro
prêmio ("Palma de Ouro) na IX Exposição Internacional de Humorismo realizada na
Europa Bordighera, Itália, por sua definição de humor acima citada, e uma
historieta, "O Judeu" (leia em "Contos", no Releituras), sobre o qual
afirmou ter podido escrever sem parecer anti-semita, pois ele próprio era judeu.
H?pouquíssimo material sobre o
biografado. A maior parte são artigos escritos por ele e por amigos, todos muito bem
humorados, cheios de nonsense, o que bem demonstra o espírito do biografado.
Leon Eliachar foi assassinado na
cidade do Rio de Janeiro, em 29 de maio de 1987. Segundo o noticiário da época, a
mando de um rico fazendeiro paranaense com cuja esposa o autor vinha mantendo um romance.
POR ALTO, BIOGRAFIA
Nasci no Cairo, fui criado no Rio; sou, portanto, "cairoca". Tenho
cabelos castanhos, cada vez menos castanhos e menos cabelos. Um metro e 71 de altura, 64
de peso, 84 de tórax (respirando, 91), 70 de cintura e 6,5 de barriga.
Em 1492, Colombo descobriu a América; em 1922, a América me
descobriu. Sou brasileiro desde que cheguei (aos 10 meses de idade), mas oficialmente, h?
uns dois anos; passei 35 anos tratando da naturalização. Minha carreira de criança
começou quando quebrei a cabeça, aos dois anos de idade; minha carreira de adulto,
quando comecei a fazer humorismo (passei a quebrar a cabeça diariamente). Tive vários
empregos: ajudante de balcão, ajudante de escritório, ajudante de diretor de cinema,
ajudante de diretor de revista, ajudante de diretor de jornal. Um dia resolvi ajudar a mim
mesmo sem a humilhação de ingressar na Política: comecei a fazer gracinhas
?fora da
Câmara. Nunca me dei melhor. Meu maior sonho ?ter uma casa de campo com piscina, um
iate, um apartamento duplex, um corpo de secretárias, um helicóptero, uma conta no
banco, uma praia particular e um "short". Por enquanto j?tenho o
"short".
Sou a favor do divórcio, a favor do desquite e a favor do
casamento. Sem ser a favor deste último não poderia ser dos primeiros. Sou contra o
jogo, o roubo, a corrupção e o golpe; se eu fosse candidato isso não deixaria de ser um
grande golpe.
O que mais adoro: escrever cartas. O que mais detesto: p?las no
Correio. Minha cor preferida ?a morena, algumas vezes a loura. Meu prato predileto ?o
prato fundo. O que mais aprecio nos homens: suas mulheres ?e nas mulheres, as próprias.
Acho a pena de morte uma pena.
Não sou superticioso, mas por via das
dúvidas, evito o "s" depois do "r" nessa palavra. Se não fosse o que
sou, gostaria de ser humorista. Trabalho 20 horas por dia, mas, felizmente, s?uma vez
por semana; nos outros dias, passo o tempo recusando propostas ?inclusive de casamento.
Acho que a mulher ideal ?a que gosta da gente como a gente gostaria que ela gostasse
?
isso se a gente gostasse dela. Para a mulher, o homem ideal ?o que quer casar. Mas deixa
de ser ideal logo depois do casamento, quando o ideal seria que não deixasse. Mas isso
não impede que eu seja, algum dia, um homem ideal.
Leon Eliachar, no livro O Homem ao
Quadrado, Livraria Francisco Alves/Editora Paulo de Azevedo Ltda., Rio de
Janeiro, 1960 (orelhas da capa e contracapa.)
AUTOBIOGRAFIA DE
UM FÔLEGO S?/font>
Meu nome ?esse mesmo, Leon Eliachar, tenho 44 anos, mas me
orgulho de j?ter tido 43, 42, 41, 40, 39, idades que muitas mulheres de 50 jamais
atingiram, sou humorista profissional peso-leve, pois detesto as piadas pesadas, consegui
atingir o chamado "preço teto" da imprensa brasileira, quer dizer, cheguei a
ganhar um salário com o qual nunca pude adquirir um teto, sou a favor do casamento, sou a
favor do divórcio, sou a favor do desquite e sou a favor dos que são contra tudo isso
que eles devem ter l?os seus motivos, fui fichado com dificuldade no Instituto Félix
Pacheco não pelo atestado de bons antecedentes, mas pelas dificuldades com que se tira um
atestado, j?fiz de tudo nessa vida, varri escritório, fiz entrega de embrulho, crítica
de cinema, crônica de rádio, comentário de televisão, secretário de redação,
colunismo social, reportagem policial, assistente de direção, peça de teatro, show de
boate, relações públicas, corretagem de anúncios, script de cinema, entrevista
política, suplemento feminino, at?chegar ao humorismo, ainda não sei se o humorismo
foi o princípio ou o fim da minha carreira, acho que ninguém faz nada por necessidade
mas por vocação, isto ? por vocação da necessidade, tenho experiência bastante pra
saber que não sou experiente, minha capacidade de compreensão chega exatamente no ponto
em que ninguém mais me pode compreender, as mulheres tiveram forte influência na minha
vida desde a minha mãe at??minha mulher, com escalas naturalmente, tive duas grandes
emoções na vida, a primeira quando minha mulher disse "sim" e a segunda quando
seus pais disseram "não", sou a favor das camas separadas, principalmente pra
quem se casou com separação de bens, não guardo rancor por absoluta falta de espaço,
uma das coisas que mais aprecio ?Nova York coberta de neve ?quando estou em Copacabana
tomando sol, o melhor programa do mundo ?ir ao dentista ?pelo menos para o dentista,
não vou a casamento de inimigo, muito menos de amigo, desde criança faço força pra ser
original e o máximo que consigo ?ser uma cópia de mim mesmo, meu grande complexo ?
não saber tocar piano, mas muito maior deve ser o complexo de outros homens que também
não sabem tocar e são pianistas, meus autores favoritos são os que me caem nas mãos,
escrevo ?máquina com vinte dedos porque minha secretária passa a limpo, gosto de
televisão às vezes quando ligo às vezes quando desligo, num enterro fico triste por
não saber fingir que estou triste, aprecio as quatro estações, mas prefiro o verão no
inverno e o inverno no verão, passei fome várias vezes e agora estou de dieta, acho a
rosa uma mensagem definitiva porque custa menos que um telegrama e diz muito mais, sou a
favor da pílula anticoncepcional porque ela resolve o problema da metade da população
do mundo, acho que deviam inventar a pílula concepcional pra resolver o problema da outra
metade, cobrador na minha casa não bate na porta perguntando se pode entrar, eu ?que
bato perguntando se posso sair, sou um homem pobre porque toda vez que batem ?minha
porta mando dizer que estou, meu cartão de visitas não tem nome nem telefone, assim
ninguém sabe quem sou nem onde posso ser encontrado, prefiro o regime da ditadura porque
não tenho trabalho de ensinar meu filho a falar, posso dizer com orgulho que sou um
humilde, sou o único sujeito do mundo que d?o salto mortal autêntico, mas nunca dei,
leio quatro jornais por dia e a única esperança que encontro são os horóscopos
cercados de desgraças por todos os lados, acredito mais nos inimigos do que nos amigos
porque os inimigos estão sempre de olho, minha maior alegria foi quando venci num
concurso internacional de humorismo, em Bordighera, Itália, obtendo o primeiro e o
segundo prêmios entre os participantes de 16 nações concorrentes, fiquei sabendo que
havia humoristas piores do que eu, procuro manter sempre o mesmo nível de humor, mas a
culpa não ?minha: tem dias que o leitor est?mais fraco.
LEON ELIACHAR, em O Homem ao Zero, Editora
Expressão e Cultura Rio de Janeiro, 1968, pág.20.
RETRATOS 3 x 4 DE AMIGOS 6
x 9
Por mais que procure ser excêntrico, Leon ?concêntrico. Pois em matéria de
conclusões consigo próprio ele confia apenas em consigo mesmo. Carioca cairoca (nasceu
no Cairo, capital de Tel-aviv), tem uma idade indefinível, entre os 25 e os 250 anos. Uns
dizem que ele nasceu depois da Segunda Guerra Mundial, outros afirmam que foi no momento
em que ele nasceu que a briga começou. Promotor nato, veio ao mundo por uma gentileza
especial do Todo-poderoso e s?pretende sair com a Bomba, isto ? numa queima geral de
todo o estoque. Dizem que ele não s?sugeriu ao Criador a idéia dos dois sexos (a
idéia do terceiro sexo foi do Sérgio Porto) como insistiu ainda para que o sexo
masculino fosse feito em gás néon, coisa que o Senhor achou de um exibicionismo
excessivo (Que pena!).
Aos três anos de idade Leon queria ser Presidente da República.
De l?pra c?sua ambição não parou. Jogador de pôquer, para combater o típico pocker-face,
ele inventou a própria cara, tão enigmática que ficou conhecida como Leonfauce. A
verdade ?que nele a natureza colocou o primeiro olho com zoom. Aliás, muitos consideram
sua cara a sua maior piada; mas parece que a piada saiu sem querer numa noite em que papai
e mamãe Eliachar estavam de bom humor. ?o único escritor brasileiro que conseguiu ter
um livro anunciado no Maracan? junto com a irradiação da renda. Com isso a renda do livro ultrapassou a do
estádio. Sua famosa campanha Ponha um Leon na sua estante deixou o tigre da
Esso com a pulga entre as pernas e o Leon da Metro com o rabo atrás da orelha. Este ano
Leon fez um programa pro Chico Anísio que acabou fazendo parte do programa. Ator de
cinema, teatro e televisão, acredita que a água do mar ?salgada e s?não vende mais
que a água potável por falta de promoção. Acha que todo mundo deve se promover at?
atingir a própria importância. Aliás, gosta tanto de gente importante que s?l?
Enciclopédia, porque ali gentinha não entra. Organizadíssimo, fez at?seguro contra
milicianos transviados e, seguríssimo, s?vai a médico quando este est?realmente em
estado grave. Sua conversa ao telefone ?tão interessante, que determinadas autoridades
j?gravaram várias. ?o primeiro a rir das próprias piadas; antes que algum infeliz o
faça. Os inimigos o consideram o maior humorista do Oriente Médio, mas a verdade ?que
sem o seu humorismo nenhum gabinete dentário pode se considerar completo. Os admiradores
acham que, quando ele morrer, deixar?uma lacuna impreenchível. Conhecendo Leon como
conheço, garanto que não vai deixar lacuna alguma leva a lacuna com ele.
Millôr Fernandes, que tem, dentre outras
qualidades, a de ser o melhor profissional de humor brasileiro, escreveu uma
série de artigos denominados Retratos 3x4 de alguns amigos 6x9. Publicado originalmente na Revista Veja, em
1969, o texto acima foi extraído de seu livro Trinta anos de mim mesmo, Editora
Nórdica Rio de Janeiro, 1972, pág.181.
APRESENTAÇÃO
Leon Eliachar de Aljubarrota
nasceu na quinta do Alverde, casa 5, lado esquerdo. Cresceu em meio às benesses
da primavera. Aos 14 anos de idade, sofreu um acidente de velocipídico, machucando o
dedão do p?esquerdo. Mais tarde, escreveria uma ode a esse respeito.
Leon Eliachar de Aljubarrota
custou muito a encontrar a rota. Mas acabou encontrando, isto aos quarenta e sete
anos (mais ou menos), no quilômetro 46 da estrada RioSão Paulo. Encontrou e
não devolveu. Sendo assim, publicou os seguintes livros: O Homem ao Quadrado
(1927), O Homem ao Cubo (416 a.C.), Por que me ufano do meu país (1870, com
a colaboração do Conde de Afonso Celso), O Homem ao Zero (1939, infelizmente
destruído pelas hordas paraguaias que nessa data fatídica invadiram o Uruguai); Quarup,
by Antônio Callado; Os Sertões, de Euclides da Cunha; Listas Telefônicas
Brasileiras, de vários autores e assinantes; Brás, Bexiga e Barra Funda, de
Vinícius de Moraes; A Nova Constituição Brasileira, 1964, autor desconhecido; Leon
Eliachar par lui même, by Leon Eliachar; Os Olhos Dourados de Ódio, edição
conjunta (digo bilíngüe) com Rubem Braga; O Homem Nu, variação de O Homem ao
Cubo; e assim por diante. Maiores detalhes, biblioteca do Museu da Imagem e do
Som, Rua Bartolomeu Mitre, 16, sobreloja.
Jos?Carlos
Oliveira fez esta apresentação (um exemplo de nonsense) do biografado no livro
"10 em Humor", Editora Expressão e Cultura, Rio de Janeiro, 1968, pág. 24.
NECROLÓGI0
O meu quem faz sou eu, que não sou bobo.
Detesto a pressa dos jornalistas que querem fechar a página do jornal de qualquer maneira
e acabam enchendo o espaço com os lugares-comuns do sentimentalismo. Nada de
coitadinho era um bom rapaz nem que era tão moço, porque h?
muito deixei de ser um bom rapaz e nem sou tão moço assim. Quero que o meu necrológio
seja sincero, porque de nada me valer?a vaidade depois de eu morrer
?a não ser a
vaidade de estar morto. Fui mau filho, mas isso não quer dizer que meus pais fossem
melhores filhos que eu se fosse eu o pai. Não fui mau marido e acredito que seja porque
não tivesse chance de ser, vontade não me faltou. Nunca roubei, nunca menti: esses os
meus piores defeitos. Minha grande qualidade era ter todos os outros defeitos. Fui
egoísta toda vida, como todo mundo, mas nunca revelei nada a ninguém, como todo mundo.
Passei a vida tentando fazer os outros rirem de si mesmos: ?possível que agora riam de
mim. Fui valente e fui covarde, s?tive medo de mim mesmo o que prova a minha valentia.
Nunca amei ao próximo como a mim mesmo, em compensação nunca ninguém me amou como eu
mesmo. Tive milhões de complexos e venci-os todos, um por um, com exceção do complexo
de morrer: esse morre comigo. Nunca dei nem tomei nada de ninguém, mas faço questão de
deixar tudo o que não tenho para os que têm menos do que eu. Nunca cobicei a mulher do
próximo: s?a do afastado. Jamais entendi perfeitamente o que era o bem e o
mal, embora a maioria das pessoas me achasse um homem de bem e este era o mal.
Defendi a minha vida como pude, mas nunca arrisquei a vida para defend?la. Nunca me
preocupei com dinheiro, pois sempre tive pouco. Acreditei mais nos inimigos do que nos
amigos, porque os amigos nem sempre se preocupam com a gente. Jamais tive um segredo,
passei todos adiante Conquistei muitas mulheres, algumas com os olhos, outras com os
lábios e outras com o braço. Tive pavor dos médicos, porque eles sempre descobrem as
doenças que a gente nem sabia que tinha h?tanto tempo. Me orgulho de ter vivido oitenta
anos em apenas quarenta: finalmente me livrei dessa maldita insônia.
Leon Eliachar em O Homem ao Cubo, Jos?
Álvaro Editor ?Rio de Janeiro, 1964, (orelhas da capa e da contracapa.)
No dia 21/06/2007, Leon Eliachar foi homenageado pela Casa de Rui Barbosa, na
cidade do Rio de Janeiro (RJ), onde estão os arquivos do humorista. Participaram do
evento o cirurgião plástico Ivo Pitanguy e o cartunista Jaguar, amigos de Leon,
e Sérgio Eliachar, filho do escritor.
BIBLIOGRAFIA:
?O Homem ao Quadrado (1960)
?capa e desenhos
de Cyro del Nero.
?O Homem ao Cubo (1963) ?capa e paginação de Fortuna.
?A Mulher em Flagrante (1965) ?capa executada por Juarez Machado; desenhos e paginação
de Fortuna.
?O Homem ao Zero (1967) ?capa de Gian.
?10 em Humor (1968) ?em conjunto com Millôr Fernandes, Stanislaw P. Preta,
Fortuna, Ziraldo, Jaguar, Claudius, Zélio, Henfil e Vagn.
Os dados acima foram obtidos nos livros do autor.
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